segunda-feira, 31 de janeiro de 2011


Ainda ontem pensava que não era

Ainda ontem pensava que não era
mais do que um fragmento trémulo sem ritmo
na esfera da vida.
Hoje sei que sou eu a esfera,
e a vida inteira em fragmentos rítmicos move-se em mim.

Eles dizem-me no seu despertar:
" Tu e o mundo em que vives não passais de um grão de areia
sobre a margem infinita
de um mar infinito."

E no meu sonho eu respondo-lhes:

"Eu sou o mar infinito,
e todos os mundos não passam de grãos de areia
sobre a minha margem."

Só uma vez fiquei mudo.
Foi quando um homem me perguntou:
"Quem és tu?"

Kahlil Gibran

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011


Adoração

Eu não te tenho amor simplesmente. A paixão 
Em mim não é amor; filha, é adoração! 
Nem se fala em voz baixa à imagem que se adora. 
Quando da minha noite eu te contemplo, aurora, 
E, estrela da manhã, um beijo teu perpassa 
Em meus lábios, oh! quando essa infinita graça 
do teu piedoso olhar me inunda, nesse instante 
Eu sinto – virgem linda, inefável, radiante, 
Envolta num clarão balsâmico da lua, 
A minh'alma ajoelha, trémula, aos pés da tua! 
Adoro-te!... Não és só graciosa, és bondosa: 
Além de bela és santa; além de estrela és rosa. 
Bendito seja o deus, bendita a Providência 
Que deu o lírio ao monte e à tua alma a inocência, 
O deus que te criou, anjo, para eu te amar, 
E fez do mesmo azul o céu e o teu olhar!... 

Guerra Junqueiro

sábado, 22 de janeiro de 2011



Amor, que o gesto humano na alma escreve

Amor, que o gesto humano na alma escreve,
Vivas faíscas me mostrou um dia,
Donde um puro cristal se derretia
Por entre vivas rosas e alva neve.

A vista, que em si mesma não se atreve,
Por se certificar do que ali via,
Foi convertida em fonte, que fazia
A dor ao sofrimento doce e leve.

Jura Amor que brandura de vontade
Causa o primeiro efeito; o pensamento
Endoudece, se cuida que é verdade.

Olhai como Amor gera, num momento
De lágrimas de honesta piedade,
Lágrimas de imortal contentamento.

Luís Vaz de Camões

terça-feira, 18 de janeiro de 2011


Segredo

Não contes do meu vestido 
que tiro pela cabeça 
nem que corro os cortinados 
para uma sombra mais espessa 

Deixa que feche o anel 
em redor do teu pescoço 
com as minhas longas pernas 
e a sombra do meu poço 

Não contes do meu novelo 
nem da roca de fiar 
nem o que faço com eles 
a fim de te ouvir gritar 

Maria Teresa Horta

sábado, 15 de janeiro de 2011


Habitas meu coração

Habitas meu coração: barbas de rei assírio
olhar de extensões alheias a tempo e medidas.
Tua voz tem asas de falcão e pousa 
nas torres mais altas do meu ser onde jamais
me aventurei. É minha a tua solidão.
Sirvo-me em silêncio e às vezes como uma
criança me apertas em teu peito: acaricio
então tua face estranho rei.
Outras vezes ouço passos ecoando no
enlace das colunas em seteiras escadas. Se
grito teu nome - és mil ressonâncias e seu eco em mim.

Dora Ferreira da Silva

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011



10 de Janeiro

"Para fazer uma obra de arte
 não basta ter talento,
 não basta ter força,
 é preciso também viver um grande amor."

Wolfgang Amadeus Mozart


Amo! 

Amo a terra! Amo o sol! Amo o céu! Amo o mar!
Amo a vida! Amo a luz! Amo as árvores! Amo
a poesia que escrevo e entusiasta declamo
aos que sentem como eu a alegria de amar!

Amo a noite! Amo a antiga palidez do luar!
A flor presa aos cabelos soltos de algum ramo!
Uma folha que cai! Um perfume no ar
onde um desejo extinto sem querer inflamo!

Amo os rios! E a estranha solidão em festa,
dessa alma que possuo multiforme e inquieta
como a alma multiforme e inquieta da floresta!

Amo a cor que há nos sons! Amo os sons que há na cor!
E em mim mesmo - amo a glória de sentir-me um Poeta
e amar imensamente o meu imenso amor!

J.G.de Araujo Jorge

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011


Para que sejamos necessários

Transfere de ti para mim essa dor
de cabeça, esse desejo, essa violência.
Que careça em ti o meu excesso
e que me falte o que tu tens de sobra.

Que em mim perdure o que te morre cedo
e que te permaneça o que tenho perdido.
Que cresça, se desenvolva um teu sentido
que em mim desapareça.

Dá-me o que de possuir tu não te importas
e eu multiplico o que te falta e em mim existe
para que nosso encaixe forme uma unidade -indivisível-
que não se possa subtrair uma metade.

Bruna Lombardi

domingo, 2 de janeiro de 2011


A Miragem

Ah! Se pudéssemos contar
As voltas que a vida dá
Pra que a gente possa
Encontrar um grande amor…

É como se pudéssemos contar
Todas estrelas do céu
Os grãos de areia desse mar
Ainda assim…

Pobre coração
O dos apaixonados
Que cruzam o deserto
Em busca de um oásis em flor
Arriscando tudo por
Uma miragem
Pois sabem que há uma fonte
Oculta nas areias…

Bem aventurados
Os que dela bebem
Porque para sempre
Serão consolados…

Somente por amor
A gente põe a mão
No fogo da paixão
E deixa se queimar
Somente por amor…

Movemos terra e céus
Rasgando sete véus
Saltamos do abismo
Sem olhar prá trás
Somente por amor
E a vida se refaz…

Marcus Viana