domingo, 5 de setembro de 2010


À Beleza

Não tens corpo, nem pátria, nem família, 
Não te curvas ao jugo dos tiranos. 
Não tens preço na terra dos humanos, 
Nem o tempo te rói. 
És a essência dos anos, 
O que vem e o que foi. 

És a carne dos deuses, 
O sorriso das pedras, 
E a candura do instinto. 
És aquele alimento 
De quem, farto de pão, anda faminto. 

És a graça da vida em toda a parte, 
Ou em arte, 
Ou em simples verdade. 
És o cravo vermelho, 
Ou a moça no espelho, 
Que depois de te ver se persuade. 

És um verso perfeito 
Que traz consigo a força do que diz. 
És o jeito 
Que tem, antes de mestre, o aprendiz. 

És a beleza, enfim. És o teu nome. 
Um milagre, uma luz, uma harmonia, 
Uma linha sem traço... 
Mas sem corpo, sem pátria e sem família, 
Tudo repousa em paz no teu regaço. 

Miguel Torga